Inexistência



Foto: Almino, João (Paris, abril de 1980). 



Vejo os poetas da minha geração 
e anteriores perdidos,
num vasto mundo, sem rumo. 


Vejo os mórbidos olhares
que surgem através dos despidos corpos
de beleza irrefutável
e surge, sobre essa, qualquer esperança
que eles possam carregar. 


Suas cabeças cheias de sentimentos vazios
e seus copos que pesam,
apenas, por terem de levar todas as impurezas. 


A rua me chama, eu vou!
carregando somente o talvez
da inexplicável existência sentimentalista. 


Carrego, também, a esperança,
vívida e vivida de um mundo pequeno
que sobressai sobre minhas curvadas costas. 


O sinal fecha e não há caminho
existe somente a estrada que fode
não só o corpo angelical, como também a alma mais suja
dos falsos poetas. 


O corpo treme, a voz falha
o suor escorre pela testa e pinga o chão
como o salgado do mar. 


A superfície tenra da alma de um ser qualquer
que busca, não só a perfeição
busca corpos nus, pelos e prazer
e salubre clama por atenção. 


O grosso sangue que sai
não por veias, ou artérias
e sim pela pura voz dos cantores de MPB que vagam pela cidade. 


São poetas cegos
não enxergam as almas que por ali vagam
vêem só o mais simples de tudo
as palavras que pichadas em muros de reboco
colorem a paisagem mórbida. 


O uivo dos lobos da geração marginal
que nunca deixou de existir
traz consigo uma, ou duas vozes de cão
e quando a noite está em seu pico
sente-se o frio na pele
e o terror correndo pelas ruas de Manhattan ou Copacabana. 


Tantos corpos nus
estendidos sobre uma manta de malha de ferro
frios e na falta do selvagem sexo endurecem
como gelo. Ou uma palavra em forma oculta. 


Ainda na noite é encontrado prazer
na ferra humana, é encontrado prazer no verdadeiro animal
é encontrado prazer nos poemas e vozes do subúrbio
nas riquezas da saudade podre. 


A reflexibilidade das gerações passadas e atuais
mesmos problemas, mesmas rimas e métricas
muda apenas autor e amor ressentido
muda endereço, muda o fervor por fazer amor. 


Muda o corpo que por dentro deixa de ser corpo
passa a ser casulo
vira a casa do inexpressivo sentimento oblíquo
que toma conta de cada detalhe corpóreo. 


A inexpressiva existência não cabe 

com o cheiro dessa doença que habita
um pedaço de todo poeta dessa e da outra geração
o mesmo diagnóstico. Inexistência de profunda alma.





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